Artigo: Dois anos da desocupação do Pinheirinho

22/01/2014 - Hoje, dia 22 de janeiro, completam-se dois anos da violenta desocupação do terreno do Pinheirinho e a memória coletiva retorna à zona sul de São José dos Campos para reencontrar ali a insensatez.

O terreno vazio é como uma ferida aberta no espaço e no tempo. Depois de dois anos, ali permanece a lembrança de muito sofrimento, de duas mortes, de vários feridos.

Ali permanecem os traumas psicológicos em crianças e adolescentes, que até hoje não suportam o barulho de helicópteros.

Ali foram derramadas muitas lágrimas das pessoas ao verem suas casas sendo destruídas. Ali foram vistos móveis e brinquedos, lembranças e recordações, sonhos e esperanças serem soterrados.

Ali foram sacrificados centenas de cachorros, muitos abatidos a tiros pela polícia, bem como tantos outros animais, como gatos e aves.

Uma comunidade construída ao longo de oito anos de luta, com afinidades, histórias e modos de viver, de compartilhar e de sonhar, entrelaçados por esforços conjuntos ao longo do tempo, que conferiram um sentido social àquele espaço, foi demolida pela violência de uma ordem judicial injustificada.

A pergunta que surge é para quê?

Depois de um festival de erros jurídicos, propositais, verdadeiras aberrações planejadas nos corredores do poder. Depois de se atropelar negociações que estavam avançadas, faltando apenas a assinatura do prefeito da época para concretizar o protocolo de intenções para regularização. Depois de se anunciar uma trégua negociada entre parlamentares e o juiz da falência. Depois de uma liminar favorável aos moradores na Justiça Federal.

Mesmo nessas circunstâncias, prevaleceu a insensatez como ferramenta de demolição. As famílias tiveram que se amontoar em alojamentos sem nenhuma condição, com muitas delas ainda morando em condições precárias. A população teve de suportar um gasto exorbitante do poder público para realizar a retirada das famílias. E o Brasil assistiu o suposto dono Naji Nahas, comemorando a retirada das famílias, em Paris, com champanhe e foie gras em restaurante de luxo.

Com objetivos inexplicáveis, as motivações são ainda mais obscuras. Surge outra dúvida: por quê?
Por que tanta pressa? Por que tanta violência? Por que, se dois anos depois, nada foi construído no terreno, que segue apenas criando mato e acumulando lixo?

Por que, se até hoje não foi pago um centavo de imposto? Por que tão pouca consciência, se o dever do judiciário deveria ser buscar a paz social? Por que, se comprovadamente a retirada das famílias ficou mais dispendiosa do que se tivesse sido regularizado o bairro? Por que o judiciário pode causar tanta dor, desalojar oito mil pessoas para beneficiar apenas uma? Por que, governador?

Passaram-se dois anos e o terreno foi devolvido à especulação. A força da comunidade permitiu prosseguir a luta e agora outro bairro será formado, com novas casas aos moradores.

O terreno do Pinheirinho continua lá, à espera de um governante que tenha coragem de exigir o terreno em troca da dívida pública. Que tenha coragem de construir ali casas populares e o Hospital Regional. Pelo tamanho e localização da área, sem dúvida, é o melhor local.

Depois de dois anos, o terreno segue abandonado, com débito milionário. A lógica da especulação se mantém. Por que no Brasil ainda não se tem uma lei para evitar despejos violentos? Por que governantes? Por que judiciário? Por quê?


Toninho Ferreira, advogado dos moradores do Pinheirinho e presidente do PSTU de SJCampos
Artigo publicado no jornal O Vale, em 22 de janeiro de 2014