Após greve de 24h, trabalhadores da Embraer fazem novo protesto e pressionam por aumento salarial

Fotos: Sindmetalsjc/Tanda Melo
22/10/2014 - Com toda pompa, na terça-feira, dia 21, a Embraer apresentava em Gavião Peixoto/SP sua mais nova aeronave, o cargueiro KC 390. Mas, em São José dos Campos, onde está a maior parte dos funcionários da empresa no país, uma greve de 24h era a expressão da revolta dos trabalhadores.

A paralisação, aprovada em assembleias em todos os turnos, teve a adesão dos cerca de 7 mil trabalhadores da produção e do setor administrativo da unidade Faria Lima (a maior da empresa). Nesta quarta, dia 22, os trabalhadores fizeram uma nova assembleia e atrasaram a entrada em três horas em novo protesto.

As mobilizações são a resposta a mais uma postura de intransigência da Embraer, empresa conhecida pela superexploração e desrespeito às reivindicações dos trabalhadores.

Na Campanha Salarial da categoria deste ano, a empresa ofereceu apenas 6,6% de reajuste salarial, o que é equivalente à inflação mais míseros 0,24% de aumento real. As paralisações também têm a ver com o pagamento da primeira parcela da PLR (Participação nos Lucros e Resultados) 2014.

Cada trabalhador receberá um fixo de R$ 912,31 mais 12,44% sobre o salário. Um funcionário que recebe R$ 3 mil, por exemplo, terá uma PLR de R$ 1.285,51. Apesar de ser uma das maiores empresas do país e passar por um momento de vendas em alta, esta é uma das PLRs mais baixas da categoria.

No primeiro semestre deste ano, o lucro da Embraer cresceu 955% em relação ao mesmo período de 2013. A carteira de pedidos firmes de aeronaves chegou ao fim do terceiro trimestre deste ano em US$ 22,1 bilhões, o maior patamar da história da empresa. O avanço na comparação com o segundo trimestre foi de 22,1%.

A recusa em pagar uma PLR maior e 10% de reajuste salarial vai contra a realidade da empresa, que tem plenas condições de atender as reivindicações da categoria. Em fábricas muito menores e com condições bem menos favoráveis do que a Embraer, os metalúrgicos conquistaram PLRs superiores e reajustes de até 11%. Não podemos admitir que a direção da empresa dê continuidade a essa política de desvalorização dos trabalhadores”, disse o vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e região, Herbert Claros da Silva.

Descontentamento crescente
Após as mobilizações, o Sindicato voltará a pressionar a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) para marcar nova negociação e cobrar o atendimento das reivindicações dos trabalhadores, que estão a cada dia mais insatisfeitos e dispostos a lutar por seus direitos.

No ano passado, foi com greve que os metalúrgicos da empresa conseguiram seu reajuste salarial. Após duas décadas sem greves unificadas entre os trabalhadores do setor administrativo e da produção, a Embraer viu seus hangares e salas parados por três vezes. No dia 8 de outubro, na fábrica da Avenida Faria Lima, e dia 23, na unidade do distrito de Eugênio de Melo, houve paralisações de quatro horas. Já no dia 31 de outubro, foi deflagrada a greve de 24 horas.

O fato é que depois de 20 anos de privatização da estatal, uma das mais estratégicas do país, a superexploração dos trabalhadores e o processo de desnacionalização da empresa são cada vez maiores.

Há anos, a Embraer impõe ataques como PLR e reajuste salarial rebaixados, forte assédio moral e uma reestruturação produtiva que aumenta cada vez mais a exploração, a precarização das condições de trabalho e as doenças ocupacionais na empresa.

A Embraer foi uma estatal construída com o dinheiro do público dos impostos pagos pela população brasileira. Privatizada por um valor irrisório, R$ 154,1 milhões, hoje está avaliada em cerca de R$ 20,4 bilhões, mas a empresa nunca deixou de depender do governo. Vale lembrar que um dos argumentos usados pelo governo para defender a privatização era justamente a falta de recursos para investir na empresa.

Se hoje a Embraer vive um bom momento é por conta do dinheiro público que recebe. Apenas entre 1997 e 2008, o BNDES desembolsou US$ 8,39 bilhões para que a Embraer colocasse seus aviões no mercado internacional. Somente em 2013, a empresa deixou de pagar R$ 300 milhões em impostos por causa da desoneração da folha de pagamento. Há ainda outros programas de incentivos, como o Reintegra, Drawback e Inova Aerodefesa.

Por outro lado, um forte processo de desnacionalização é outro fator que marca a situação da empresa na atualidade e é mais um elemento que afeta os trabalhadores.

O próprio KC-390, que teve seu protótipo apresentado publicamente no mesmo dia da greve de 24h dos trabalhadores da Embraer de São José dos Campos, é uma das principais apostas de sucesso da empresa, mas é também a expressão desse processo. A aeronave é a que mais tem componentes importados. Cerca de 70% de sua fuselagem será fabricada fora do país.

O que deveria gerar emprego está gerando demissões, em razão da transferência de produção para outros países. É o que ocorre com outros dois modelos, por exemplo. A montagem dos aviões Phenon e Legacy seguirá para os Estados Unidos.

Empresas da região, como a C&D e a Latecoere sofrem efeitos dessa política, e correm o risco de fechar as portas e demitir trabalhadores até 2016.

Os anos de privatização da empresa e a política de exploração cada vez agressiva para gerar lucros a acionistas estrangeiros tem deteriorado as condições de trabalho e isso está na base da insatisfação cada vez maior dos funcionários”, avalia Herbert.

Para os trabalhadores, o único caminho para que possam garantir seus direitos é aumentar sua auto-organização e sua mobilização. Temos claro também que para que a Embraer possa voltar a servir aos interesses do país, é preciso impedir esse processo de desnacionalização e devolver a empresa para o povo brasileiro com sua reestatização sob controle dos trabalhadores”, afirma Herbert.


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